Um cálculo da ASPR Auditoria e Consultoria mostra que , considerando um novo imposto de 4% sobre o faturamento, as empresas precisariam ter uma folha de salários que atinja pelo menos 40% do faturamento da empresa para a troca ser “vantajosa”. “Se a folha de salários for em percentual menor, a empresa sairá perdendo com a proposta porque o dispêndio com o novo tributo será maior do que a redução de 10% na contribuição previdenciária”, diz Douglas Rogério Campanini, consultor da ASPR.
Os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que a folha de salários em diversos setores está bem aquém dos 40% do faturamento. No total da indústria de transformação, por exemplo, os salários, retiradas e outras remunerações representam 7,85% da receita total das empresas, segundo a Pesquisa Anual da Indústria de 2005. Mesmo considerando todos os gastos de pessoal – que incluem, além de folha de salários, os encargos do trabalho – o percentual chega a 11,66% da receita total. Mesmo num setor que usa mão-de-obra intensiva, como a confecção de artigos do vestuário e acessórios, os gastos com pessoal chegam a 24,4%. Só a folha de salários fica em 18,9%.
O total do setor de serviços, que tende a ter uma folha de salários mais representativa, também não chega a gastar 40% da receita operacional com folha de pagamentos. Os salários, retiradas e outras remunerações no total de serviços representam 18,31% da receita operacional, considerando os dados da Pesquisa Anual de Serviços do IBGE, de 2005. “Um escritório de contabilidade tem, em média, uma folha de salários de 25% sobre o faturamento”, diz Campanini.
“É bem provável que para as empresas os 4% sobre faturamento signifiquem um desembolso maior do que os 10% sobre folha de salários”, diz a advogada Ana Cláudia Akie Utumi, do Tozzini Freire Teixeira e Silva. “Se for dada oportunidade de escolha, com certeza para muitas será melhor continuar com a contribuição de 20% sobre a folha.”
Helcio Honda, assessor jurídico da Federação da Indústria do Estado de São Paulo (Fiesp), diz que a proposta ainda não foi discutida dentro da entidade. Para ele, porém, a sugestão é inviável. “O que as empresas pedem não é a substituição de tributos, mas sim uma desoneração da folha de salários. E essa não é uma proposta de desoneração.”
Honda questiona ainda a relação entre o faturamento e os recursos previdenciários. “As empresas recolhem o INSS sobre folha de salários porque contribuem para a Previdência de uma forma proporcional ao número de trabalhadores que empregam. Não há sentido em substituir a base desse recolhimento pelo faturamento.”
O diretor-executivo da Associação Brasileira das Indústrias de Calçados (Abicalçados), Heitor Klein, diz que não conhece a proposta da Receita Federal em detalhes, mas a princípio a medida não deve trazer redução de carga tributária para o segmento exportador de calçados. “Para quem exporta, a folha de salários representa entre 35% e 40% do faturamento”, diz. Já o setor calçadista dedicado ao mercado doméstico, diz ele, pode ser “penalizado”. Klein explica que a folha de salários tende a ter um peso menor nos fabricantes de calçados que vendem no mercado interno.
A promessa de que a substituição de uma contribuição previdenciária por um imposto sobre o faturamento não traria aumento de carga às empresas não tranqüiliza os tributaristas. “Essa promessa foi feita quando o PIS e a Cofins foram transformados em contribuição não-cumulativas.
A elevação de alíquotas, segundo o governo federal, não traria aumento de carga tributária para as empresas, mas não foi isso que aconteceu”, lembra Ana Cláudia. “A brutal elevação de arrecadação do PIS e da Cofins depois da não-cumulatividade foi uma prova do aumento de carga.” Na época, diz Ana Cláudia, a expectativa foi de que esse acréscimo de arrecadação já servisse para a Receita Federal como uma compensação à desoneração da folha de pagamentos.
“O faturamento é a pior base de cálculo que pode existir para as empresas”, diz o advogado Roberto Quiroga, sócio do escritório Mattos Filho Advogados. Para ele, a tributação sobre faturamento é de fácil arrecadação para a Receita Federal, mas prejudica as empresas porque elas mantêm a obrigatoriedade de recolhimento em situações de prejuízo.
“Caso a proposta seja mantida, a concentração na carga sobre o faturamento, que já é grande, vai aumentar ainda mais, causando distorções sobre o contribuinte”, diz o advogado Júlio de Oliveira, do Machado Associados. “Esse tipo de cobrança não leva em consideração a capacidade contributiva da empresa, o que aumenta ainda mais a probabilidade de o novo tributo ser repassado imediatamente aos preços.”
Fonte – Valor Online